terça-feira, 20 de outubro de 2015

Malabarismos Pensasmáticos sobre O Livro do Riso e do Esquecimento, de Kundera.


 Pensei muito antes de conseguir começar a escrever esse texto. Milan Kundera é algo que mexe demais com minha cabeça. Não sei sobre ou como escrever sobre ele. Malabarismos pensasmáticos foi um nome que dei no carro, enquanto ia até Curitiba e pensava sobre como escrever. Malabarismos porque sempre será uma troca ideias no sentido confuso - quando uma bola vem, outra toma o lugar, numa coisa rápida e contínua. Achei uma boa metáfora. Pensasmáticos é junção de pensamento com asmáticos. Malabarismos de pensamento, mas que são asmáticos. Têm dificuldade em respirar, em viver meus pequenos pensamentos sobre O Livro do Riso e do Esquecimento, do Milan Kundera. Agora estou com calor. Agora não sei como vou escrever. Mas estou me obrigando a escrever. Já li outro livro desse autor tcheco, que é mais conhecido - o gif ali em cima é do filme - que é A Insustentável Leveza do Ser, que, desde o momento que li, se tornou um dos meus livros preferidos da vida, embora eu sempre fosse incapacitada de falar uma palavra sobre ele. 
 Milan Kundera é um desses autores que precisam falar por si mesmos, o que quer dizer que sim, eu vou copiar muitas das partes que me tocaram profundamente - e a maioria não foi de uma boa maneira. Ele é um ator completamente sincero - e por isso mesmo triste. Triste porque é real demais, porque as vezes você tem a sensação de que ele está colocando toda a humanidade em cima de uma mesa, abrindo seu corpo com um bisturi e expondo todas suas feiuras por meio das letras. É um autor que me faz sentir angústia, mas por isso mesmo é extremamente genial. 
 Primeiramente, a gente tem que lembrar que Milan Kundera é um autor da República Tcheca, que nasceu em 1929  e teve como influencia Kafta - ao qual ele faz muitas referências nesse livro - e já vi frases dele enquanto lia sobre Schopenhauer e Nietzsche. E boa parte dos livros dele são escritos durante a invasão russa no país dele. Um tempo muito triste, infelizmente. O cara ainda está vivo, com 86 anos, atualmente. O livro em questão do qual estamos falando foi escrito em 79.

" -Sua mulher deveria compreender que você a ama, mas que é um caçador, 
e que essa caça não a ameaça. De qualquer maneira, nenhuma mulher entende isso."

 Poligamia  é um assunto que ele trata muito em seus livros - não como uma natureza inquestionável do humano, mas como natureza inerente de algumas pessoas, que precisam profundamente de mais de uma pessoa para se manterem. Milan Kundera escreve muitas vezes sobre o amor. Mas é um tipo diferente de amor - é um tipo que aceita sexo com sua melhor amiga e amante de seu marido e, mesmo acontecendo esse ato, o amor se mantem. Ele questiona demais a fidelidade. Se enfim, ela é uma virtude ou um pecado feito a si mesmo.
  Ele tem um estilo que é seu marcante, e te faria reconhecer o autor mesmo que o livro estivesse sem essa informação na capa. Esse livro é dividido em sete partes, cada uma com personagens diferentes. E ele sempre acaba misturando no meio capítulos sobre sua própria história, sobre si mesmo, com algumas confissões suas, com algumas de suas reflexões em geral.

" Vocês sabem o que acontece quando duas pessoas conversam. Uma fala e outra lhe 
corta a palavra. Uma fala a outra lhe corta a palavra: é exatamente como eu, eu... e começa a falar de si até que a primeira consiga por sua vez cortar: é exatamente como eu, eu... [...] Pois toda a vida do homem entre seus semelhantes nada mais é do que um combate para se apossar do ouvido do outro. "

  No começo, quando li essa parte, não entendi o porque de toda a angustia que me causou. Mais, relendo, eu percebi o porque: ele simplifica totalmente a vida humana, ao ponto de ela ser tão sem sentido e insignificante que se pode facilmente rir dela. E esquecê-la. O que fica evidente nesse outro trecho:

" Pois era exatamente esse riso que eu gostaria de ouvir quando escrevia aqueles
artigozinhos bobos a respeito de Peixes, Virgem e Áries; era exatamente esse riso 
que eu imaginava como recompensa, mas ele não chegava de parte alguma,
porque nesse meio tempo os anjos, no mundo inteiro, tinham ocupado todas as
posições decisivas, todos os estados-maiores, tinham conquistado a esquerda e
a direita, os árabes e os judeus, os generais russos e os dissidentes russos. Eles
nos olhavam de todas as partes com seu olho glacial e esse olhar nos tirava a simpática
roupagem de alegres mistificadores e nos desmascarava como pobres impostores
que trabalhavam para a revista da juventude socialista sem acreditar nem na
juventude nem no socialismo, que faziam um horóscopo para o redator-chefe pouco
se importando tanto com o redator-chefe como com os horóscopos, e que se ocupavam
com coisas irrisórias quando todo mundo a nossa volta ( a esquerda e a direita, os
árabes e os judeus, os generais e os dissidentes), combatia pelo futuro do gênero humano.
Sentíamos sobre nós o peso de seu olhar que nos transformava em insetos dignos
de serem esmagados com o pé. "

 Esse é um dos capítulos que ele fala sobre ele mesmo, e uma dessas partes em que ele faz com que nos sintamos completamente mudos. Confusos. Sem vontade de continuar a viver - por que o que mais somos do que insetos dignos de serem esmagados com o pé?


 E agora eu meio que fiquei frustrada sobre não ter feito tópicos sobre o que escrever, e a escolha de Malabarismos Pensasmáticos foi incrivelmente boa. Milan Kundera parece quase revoltado com a humanidade e si mesmo nesse livro, e na última parte que li, foi a referencia que ele fez a Kafta, ao livro em que ele define Praga como uma cidade que perdeu sua história, uma cidade sem nome. E no mesmo parágrafo chama os humanos de ignorantes. 
 " Aí, Amanda, mas qual a história do livro? " Kundera não nos dá histórias. Ele nos dá o que pensar - haha. Como já disse, se divide em sete partes, com vários personagens deprimentes e com vidas medíocres por todo o livro - tem uma parte em primeira pessoa que ele conta sobre como era quando o pai dele estava quase morrendo por causa de uma doença, que o impossibilitava de falar, que ele define como um homem que sabia tudo mas não podia falar outra coisa que não: " É estranho."

" Essa conversa com o chofer do táxi esclareceu para mim a natureza da 
atividade de escritor. Nós escrevemos livros porque nossos filhos se
desinteressam de nós.  Nós nos dirigimos ao mundo anônimo porque 
nossa mulher tapa os ouvidos quando falamos com ela. "

Devo dizer que essa frase me magoou profundamente. Me magoou porque eu sabia que era verdade. E é isso a mágica de Kundera, como já falei. Esfregar a triste realidade em sua cara de bobo. Escancarar que ninguém quer te ouvir - e por isso escreves. 

 Enfim. Irei fazer uma parte dois disso tudo. Ainda tenho muito o que escrever sobre esse livro - já que a mulher tapa os ouvidos quando falo com ela.





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